Vampira/Magneto

Em 2011, finalmente aconteceu o que deveria ter ocorrido há muitos anos nas comics de X-Men: os personagens Rogue (Vampira, no Brasil) e Magneto assumiram o amor que sentem um pelo outro e passaram a ter um romance juntos. Os fãs mais novos, ou que só estão acostumados com os filmes e desenhos da franquia, podem ter pensado que tal formação de casal foi absurda. Esse post tem como objetivo demonstrar todo o subtexto e o envolvimento entre ambos, que na minha opinião estão entre os melhores e mais bem construídos personagens das HQs (quando nas mãos de bons roteiristas, é claro), e mostrar o quanto ela faz todo o sentido – o que pode não ser uma novidade para os fãs mais velhos, mas considerando que X-Men é uma comic que já dura quase cinquenta anos, nunca é demais informar. Antes de chegarmos ao porquê dessa conclusão, detalharemos um pouco o histórico de cada um dos personagens.

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MAGNETO

Pseudônimo de Max Eisenhardt (também conhecido como Magnus e Erik Lehnsherr), estreou como um vilão logo na primeira edição de X-Men, como um terrorista decidido a destruir toda a humanidade. O arquiinimigo dos X-Men e ex-melhor amigo do Professor Xavier era um vilão unidimensional e sem características muito marcantes – assim como as próprias primeiras edições de X-Men o eram, já que não passavam de uma cópia da equipe Doom Patrol, da DC Comics (até mesmo os fato do líder da equipe ser um professor paraplégico foi copiado!). Nos anos 70, prestes a ser cancelada, a comic passou por uma famosa reformulação, nas mãos do roteirista Len Wein e do desenhista Dave Cockrum. Wein e Cockrum criaram personagens inéditos que se tornaram muito populares com o tempo, como Storm (Tempestade), Colossus e Nightcrawler (Noturno) e o único deles que não se tornou popular (talvez por ter morrido em sua segunda missão), Thunderbird (Pássaro Trovejante), além de introduziram personagens já existentes, como Wolverine (também criado por Wein), Banshee e Sunfire (Solaris).

Mas foi nas mãos do roteirista Chris Claremont que os personagens passaram a tomar forma de verdade. Claremont desenvolveu personalidades distintas para todos eles e tornou-os personagens muito marcantes, multifacetados e humanos. ComMagneto, não foi diferente; na edição 150 de Uncanny X-Men, o personagem foi revelado como um sobrevivente do holocausto durante a Segunda Guerra Mundial, e que presenciou a morte de seus pais, e de muitos de seus semelhantes, enquanto era um prisioneiro, e que havia perdido uma filha nas mãos de humanos. Também nessa histórica edição, ao ferir a personagem Kitty Pryde, Magneto enxerga que não estava sendo diferente daqueles que combatia, e se sente destruído por trair seus ideais e ferir uma criança.

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Após uma série de eventos, que envolvem o fato do personagem ter voltado a ser um bebê (e depois restaurado aos seus 40 e poucos anos), a descoberta de que dois dos Avengers (e ex-comparsas), Quicksilver (Mercúrio) e Scarlet Witch (Feiticeira Escarlate) eram seus filhos sobreviventes, e principalmente o seu julgamento comoMagneto (conforme visto nessa edição, onde ele foi considerado culpado de todos os crimes como Magneto, mas foi permitido que ele vivesse uma vida normal se jamais assumisse a identidade novamente), colaboraram para a redenção do personagem, que se concretizou completamente quando Xavier, ferido, pediu para que Magnetocuidasse dos X-Men e dos New Mutants durante sua ausência, o que ocorre exatamente nesta mesma edição.

E durante cinco anos, Magneto o fez. Porém, ele nunca deixou de ser julgado como um vilão e todas suas atitudes, por mais bem intencionadas que fossem, eram vistas por maus olhos até mesmo por seus alunos, os rebeldes New Mutants. Durante a saga Queda dos Mutantes, Magneto testemunhou a morte de todos os X-Men sem poder fazer absolutamente nada; logo depois, obviamente, eles ressuscitaram, masMagneto não sabia, já que o mundo os considerava mortos. As condições de vida para os mutantes passaram a ser cada vez mais perigosas, e Magneto se viu obrigado a pedir a ajuda de vilões como Dr. Doom (Dr. Destino) e Red Skull (Caveira Vermelha); ao aliar-se com esse último, sentiu-se enojado, pois o Caveira é um criminoso nazista, e desmanchou a aliança pouquíssimo tempo depois. E finalmente, ao tentar estabelecer a paz na Terra Selvagem, confrontou a vilã Zaladane, que se dizia sua filha, mas na verdade havia roubado os poderes de sua verdadeira filhaLorna Dane, a Polaris. Em um ato de fúria, Magneto a matou, e renunciou todas suas tentativas de proteger a humanidade, tornando-se um vilão novamente, fase que durou durante praticamente todos os anos 90.

Eventualmente, Magneto foi dado como morto nas páginas de New X-Men em 2001 após o país Genosha, que presidia, ser destruído por um Sentinela enviado pela vilãCassandra Nova, irmã do Professor X. Ele reapareceu vivo e bem na minissérieExcalibur (não confundir com a equipe homônima), escrita por Chris Claremontnovamente. E enquanto Claremont escreveu o personagem, foi deixado claro que ele não era mais o vilão de outrora e estava disposto a reconstruir o país ao lado deXavier, o qual explicitamente se referiu como um amigo. Quando Claremont assumiu um título próprio X-Men Forever, e deixou de escrever as histórias dos mutantes,Magneto novamente voltou a ser um vilão e costumava atacar os X-Men sem motivo algum. Mas quando Xavier foi dado como morto nas páginas de X-Men Legacy, foiMagneto que o resgatou e cuidou de sua recuperação. E não demorou muito para que o mestre do magnetismo voltasse a trilhar o caminho correto para a paz entre as espécies, pois em 2009, o personagem mostrou-se decidido a integrar a equipe novamente e aliar-se aos heróis sem segundas intenções, provando isso ao salvar a personagem Kitty Pryde, que se encontrava presa em um míssil no espaço. O esforço de Magneto foi tão torturante que ele chegou ao ponto de entrar em coma após salvá-la. Desde então, ele tem se mostrado um aliado cada vez mais valioso aos mutantes e ganhado o destaque que sempre mereceu.

Numa entrevista em 2008, Stan Lee, criador do personagem, disse que nunca o enxergou como um vilão e que roteiristas não deveriam tratá-lo como tal. Muitos roteiristas, como Chris Claremont, e a enorme maioria dos fãs concordam com essa visão do personagem, que não pode ser definido em linhas tão simples como “herói” e “vilão”. Demorou muito, mas finalmente a Marvel percebeu que esta caracterização do personagem é a mais identificável e mais apropriada para um personagem do porte de Magneto.

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ROGUE

Assim como Magneto, Rogue também é uma ex vilã. Seu passado é repleto de mistério; até mesmo seu nome, Anna Marie, só foi revelado em 2006, sendo que a personagem foi criada em 1982. Tudo que se sabe é que Anna fugiu de casa ao descobrir seu poder de absorver memórias (e poderes de outros mutantes) e deixar seu namorado Cody Robbins em coma por acidente, e foi adotada pela vilã Mystique(Mística) e sua esposa Destiny (Sina), tornando-a irmã de criação de Nightcrawler. Outras informações sobre seu passado são bastante contraditórias. Nos anos 80, foi revelado que Rogue nunca conheceu seu pai e que Mystique e Destiny a adotaram antes da manifestação de seus poderes, mas o roteirista Scott Lobdell deixou implícito nos anos 90 que ela fugiu de casa após seu pai descobrir sobre sua mutação. (Opinião pessoal: assim como diversos fãs, costumo ignorar o que Scott Lobdell escreveu nos X-Men)

Inicialmente, Rogue seria introduzida nas páginas da série solo de Carol Danvers, aMs. Marvel, em 1979, mas a série foi cancelada e a edição em que Rogue aparece só foi publicada muitos anos mais tarde, mais precisamente em 1992. Portanto,Rogue estreou no décimo Avengers Annual, de uma forma bem diferente da atual: encapuzada, de cabelos curtinhos e pouca beleza. Rogue era integrante da nova Irmandade dos Mutantes, reformulada e liderada pela mãe. Inicialmente, ela não queria fazer parte disso, mas após o incidente com seu namorado, decidiu aceitar.Mystique foi responsável por transformar a solidão e amargura e Rogue em fúria e ódio, dessa forma diretamente convencendo a garota a fazer parte da equipe terrorista.

Durante esse período, enfrentou os X-Men diversas vezes, uma delas bastante memorável, ocorrendo no Pentágono. Também nesta época, Rogue criou uma inimizade com a mutante e cantora Dazzler (Alison Blaire; Cristal no Brasil, o que causou uma confusão com a personagem Crystal, dos Vingadores, que tornou-se… Cristalys no Brasil) na época namorada de Angel, dos X-Men, após Mystique ordenar que ela roubasse os poderes de Angel, já que esse era o único X-Men cuja identidade, Warren Worthington III, era conhecida publicamente, e dessa forma ela poderia descobrir onde os X-Men estavam localizados.

Foi logo em sua primeira edição que Rogue foi revelada como inimiga de Ms. Marvel, já que havia absorvido todos os poderes e memórias da personagem em uma luta. A pobre Carol precisou da ajuda do Professor Xavier para recobrar sua memória, e por razões óbvias, isso criou uma inimizade bem grande entre ambas. Rogue, porém, passou a ter consciência do que fez com o tempo, e nunca conseguiu se perdoar por isso. Como se não bastasse, e quanto mais pessoas ela tocava, mais sua mente se enchia de fragmentos psíquicos de suas vítimas. A mente de Rogue, já bem afetada, passou a ser dominada pela psique de Carol Danvers, que tomava seu corpo toda vez que Rogue estava enfraquecida de alguma forma, seja fisica ou mentalmente. Foi tornando-se mais difícil para ela manter sua própria personalidade, até porque, sem que ela soubesse, o vilão Mastermind estava ajudando neste processo, para se vingar de Mística por tabela. Tomada pela culpa e temendo perder sua sanidade,Rogue pediu ajuda ao telepata mais poderoso do planeta, Professor Charles Xavier, líder de alguns de seus maiores inimigos: os X-Men.

Xavier não conseguiu ler sua mente, mas prometeu ajudá-la. Os X-Men ameaçaram desmanchar a equipe caso Xavier a aceitasse nos X-Men, mas ele os convenceu de que todos mereciam uma chance e há oportunidade para todos os mutantes em seu Instituto. Logo que entrou para a equipe, ninguém confiava em Rogue (e com bons motivos para tal) e ela era vista como uma ameaça latente para os X-Men. Wolverine, velho amigo de Carol Danvers, tratava-a como lixo, e pouco tempo depois, a própriaDanvers, agora usando o codinome Binary, enfrentou os X-Men por não admitir que “aquilo” estivesse entre seus amigos. Somente após tomar um tiro e quase morrer para proteger Mariko, noiva de Wolverine, ela começou a ganhar seu respeito e admiração; não muito tempo depois, ela arriscou a própria vida para salvar Colossus. Ambos tornaram-se grandes amigos de Rogue e hoje em dia é até estranho imaginar que ambos não confiavam nela de forma alguma em sua estreia.

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MAGNETO E ROGUE

Após Magneto tornar-se líder da equipe, ele e Rogue se aproximaram e se identificaram bastante, afinal, eram duas almas torturadas que estavam no caminho para a redenção. Após uma série de eventos muito longos para esse post, a psique de Carol Danvers tomou vida própria e a atacou ferozmente. Rogue acabou sendo teletransportada para a Terra Selvagem, sem poderes (graças à personificação), e estava à beira da morte quando Magneto a salvou, destruindo a personificação deCarol Danvers. Durante essa época, Magneto e Rogue tornaram-se ainda mais próximos, e foi quando surgiu um clima mais romântico entre ambos, principalmente pelo fato dela estar sem poderes e poder tocá-lo sem medo e livremente, o que aumentou a afeição entre eles. Com a ajuda dos heróis Ka-Zar e Nick Fury, a dupla, que já era quase um casal, tentou instaurar a paz na Terra Selvagem. A vilã Zaladane, citada acima, se proclamou líder daquele lugar e planejava dominar o mundo inteiro utilizando os poderes de Magneto. Infelizmente, o casal acabou terminando antes mesmo de começar, pois Magneto recobrou seus poderes, matou Zaladane e jurou que nunca mais protegeria a humanidade. Durante confrontos posteriores com os X-Men, Magneto evitava atacar Rogue, que não escondia sua mágoa, dizendo coisas carregadas de ironia, como “nunca me ligou, nunca me escreveu, estava começando a imaginar quando você ia se esquecer de mim”, frase que Magneto não consegue responder.

Na saga Era do Apocalipse, que se passa em uma realidade alternativa após Legion, filho de Xavier, voltar ao passado para matar Magneto e acabar matando o pai por acidente, Magneto é um herói sem segundas intenções e líder dos X-Men. Ele também é o marido de Rogue e tem um filhinho com ela, chamado Charles, em homenagem ao amigo falecido. Apesar de se passar em uma outra era, é deixado claro que o romance entre Magneto e Rogue nunca deixou de ser uma possibilidade, mesmo que ambos tenham tomado caminhos diferentes após os eventos na Terra Selvagem. Além disso, a Era do Apocalipse é uma das poucas sagas que valem a pena na lastimável década de 90 (pelo menos para os X-Men).

Em meados dos anos 90, surgiu em X-Men um personagem chamado Joseph, supostamente Magneto rejuvenescido e sem memória. Na época, Rogue tinha um romance complicado com o personagem Gambit, e Joseph acabou tornando-se um rival por suas afeições, deixando bem claro que Rogue nunca esqueceu o tempo que passou com Magneto na Terra Selvagem. Em determinada ocasião, Josephconseguiu controlar os poderes de Rogue e ambos se beijaram. Nessa época,Gambit havia sido revelado como um traidor dos X-Men (um retcon bem mal feito, na verdade, pois o personagem sequer havia sido criado quando seu “crime” – denunciar a localização dos mutantes Morlocks aos Carrascos, que aniquilaram a grande maioria deles – aconteceu, e havia sido estabelecido há muito tempo de que os Carrascos descobriram os Morlocks seguindo um deles. Tinha que ser coisa do Scott Lobdell!), e Rogue sentiu-se traída a ponto de deixá-lo morrer na Antártida (…). Pouco tempo mais tarde, Joseph foi revelado como um clone de Magneto (ou melhor, era um personagem tão ruim que os roteiristas decidiram transformá-lo em um clone), que estava vivo e bem em outro lugar, e que havia voltado a agir como vilão.Joseph sacrificou-se para impedir que Magneto destruísse a Terra (eu já disse que odeio os X-Men dos anos 90?) e só voltou em 2011, ironicamente como um vilão ressuscitado e brainwashed, lutando contra Magneto, agora novamente um herói.

Foi também em 2011 que Rogue, há alguns anos separada de Gambit e já sob controle de seus poderes, lutou novamente ao lado de Magneto (mais precisamente na HQ X-Men Legacy). Em uma já clássica cena, ambos confessaram o amor que nunca deixaram de sentir um pelo outro e se beijaram, oficializando o romance após vinte anos. E que esse casal, uma das poucas mudanças positivas na equipe dos mutantes nos últimos anos, dure por muitos anos. Nos resta torcer para que nenhum roteirista incapaz transforme Magneto num vilão unidimensional novamente ou mate um dos dois seguindo a lógica falha de que “casais não podem ser felizes na ficção”.